Professor Everson Feitosa
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terça-feira, 12 de dezembro de 2017
Talento de povoado em PE alça voos cada vez mais altos
A
distância entre dois pontos é um cálculo que o pernambucano Júlio
César Coelho de Amorim, de 14 anos, tem feito com muita frequência
desde que passou a se dedicar à Matemática. Não por se tratar do
exercício preferido, mas pela curiosidade em descobrir quão longe
ela ainda pode levá-lo.
Acostumado
a percorrer 11 km de estrada diariamente até a escola, o adolescente
morador de Simpatia – povoado com 500 habitantes na zona rural de
Petrolina (PE) – decidiu fazer um trajeto quase dez vezes maior
para participar de um curso de aprofundamento na disciplina.
Tudo
começou em 2014, quando ele e três colegas da Escola Engenheiro
Alfredo Amorim Coelho participaram na Universidade do Vale do São
Francisco (Univasf) de Juazeiro (BA) de uma competição municipal
com desafios do Banco de Questões da OBMEP.
Na
Univasf, os estudantes souberam que no campus do outro lado do Rio
São Francisco, em Petrolina, havia um projeto preparatório para a
olimpíada nacional. Batizado de “Descobrindo talentos em
Matemática”, o programa era dirigido por Severino Cirino, um dos
coordenadores da OBMEP em Pernambuco. O grupo se empolgou.
“Ficamos
muito interessados, mas morávamos a quase 100 km de distância. Como
estávamos obcecados por aquela Matemática, reunimos 13 alunos e
fretamos uma van. Era caro, R$ 30 por semana para cada”, conta
Júlio César, agora aluno da Escola Municipal João Rodrigues de
Macedo, em Cristália, também na zona rural de Petrolina.
Até
hoje, Júlio participa do projeto, em parceria com o Núcleo de
Pesquisa e Ensino em Matemática da Univasf. Em sua sexta edição, a
iniciativa atende 376 estudantes de 40 escolas públicas e seis
particulares em Petrolina, Juazeiro e cidades vizinhas. Eles têm
aulas com professores universitários e das redes municipal e
estadual, que usam uma metodologia de ação e reação.
Após
o projeto, regional conquistou 108 medalhas
“A
ideia central é aproveitar a reação do estudante quando lhe é
proposto um problema. O professor age como mediador. É a partir da
reação que se constrói a relação ensino-aprendizado”, diz
Severino, mentor e coordenador do projeto de extensão da Univasf e
de uma regional da OBMEP. Ele bolou a iniciativa logo após assumir a
coordenação regional e constatar o baixo desempenho das escolas na
olimpíada.
Na
época, 2011, a regional ganhara três medalhas e 100 menções
honrosas. Desde a criação do projeto, no ano seguinte, o número de
conquistas aumenta. Totaliza até agora 108 medalhas (10 ouros, 27
pratas e 71 bronzes) e 1.210 menções honrosas. Na edição de 2017,
foram 23 medalhas e 199 menções. O número de inscrições para o
processo seletivo saltou de cerca de 20 para 1.100 em 2017. “Os
resultados nos estimulam a dar continuidade ao projeto”, afirma
Cirino.
Escola
multisseriada
Por
causa do “Descobrindo talentos em Matemática”, a rotina de Júlio
César aos sábados é sagrada: levanta antes de clarear e, às 5h30,
segue na van para Petrolina. Das 8h30 às 11h30, concentra-se nas
aulas. Depois, pega a condução para, em 3 horas, voltar a Simpatia,
onde mora com o pai, Joseli, mecânico; a mãe, Hermenegilda,
diretora pedagógica e sua primeira professora; e o irmão mais novo,
José Augusto, de 10 anos.
Até
o 5º ano, ele estudava em uma turma multisseriada (com alunos de
idades e anos diferentes) na Escola Municipal Tenente Jessé, em
Hilário Rodrigues da Costa, também na zona rural, onde Hermenegilda
trabalha.
Em
2014, a escola chamou a atenção ao conquistar o terceiro lugar na
Copa de Resolução de Problemas, em disputa com outras 33. “Foi
uma surpresa porque é um distrito da zona rural”, disse o
coordenador, referindo-se às limitações de infraestrutura da
região.
Pouco
depois de ingressar no projeto, Júlio César ganharia a primeira
medalha na OBMEP, em 2015. “Corri atrás do ouro. Como não tinha
internet em casa, ia à escola no contraturno e baixava o máximo de
material possível para estudar. Com muito esforço e apoio da
família, consegui”, relata.
Rio
e Canadá
Seus
novos cálculos de distância o fizeram percorrer um longo e
prazeroso trajeto até a premiação no Rio. “Antes, era só um
menino com facilidade em Matemática. Agora vejo a minha vida
transformada pela OBMEP. Passei a ver as oportunidades. Descobri que
a Matemática pode ser um ganha-pão.”
Cirino
lembra que, no ano passado, a Matemática levou o estudante a um
local ainda mais distante. Com mais 19 alunos e dois professores da
rede pública de Petrolina, participou de curso de 15 dias na
Universidade de Toronto (Canadá), após se destacar entre os
primeiros colocados de um processo seletivo.
“A
viagem abriu minha mente para ver como é o mundo lá fora. Desejo
sair de Simpatia, onde praticamente não há opções de lazer e
oportunidades. Penso em fazer Engenharia Elétrica ou Mecânica e,
depois, tentar pós-graduação em Matemática. Depende do que o
futuro reservar para mim.”
Não
importa quão longe seja, Júlio César já mostrou que, pela
Matemática, ele vai atrás. Para 2018, nem precisa fazer cálculo de
distância. Já sabe que de Simpatia até o Rio são 2.000 km. Pode
ser que refaça o trajeto para receber o seu terceiro ouro,
conquistado na OBMEP 2017.
Publicação
Original em:
https://impa.br/page-noticias/talento-de-povoado-em-pernambuco-alca-voos-cada-vez-mais-altos/
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